terça-feira, 2 de abril de 2024

“O futuro é ancestral”: a voz dos povos indígenas nos chama

 

“Eu peço que todo mundo descontrua tudo aquilo que vocês sabem sobre povos indígenas. (...) As pessoas que pensam em Amazônia (...) pensam em um grande tapete verde de floresta. Não é só um tapete verde, não é só floresta. Existem pessoas ali. Existem povos ali. (...) A gente se sente pertencente no território, como uma extensão. Então, todas as vezes que tem desmatamento, queimada, garimpo ilegal, caça e pesca ilegal, tráfico humano, de drogas e tráfico de animais dentro do território é como se estivesse acontecendo com o nosso corpo.” A fala da líder indígena Sam Saterê-Mawé sintetiza, em poucos minutos, 524 anos de extermínio, descaso e sofrimento dos povos originários do Brasil. 


 

E, apesar da segregação a que foram submetidos ao longo de todo este tempo, Sam tem uma fala que acolhe e convida à parceria para proteger o bioma que ela é e onde habita: “Existem ribeirinhos, comunidades quilombolas, povos indígenas, unidades de conservação, terras indígenas e que também precisam participar enquanto agentes ativos dessa preservação, da transformação e de tudo o que envolve o nosso bioma. A gente vai lá e protege, mas a gente precisa da ajuda de vocês.” 

Abril é conhecido como o mês da resistência indígena. E o dia 19, conhecido, até muito pouco tempo, como “dia do índio”, passou a se chamar, desde 2022, “dia da resistência indígena”. A contribuição dos povos originários e toda a sua pluralidade vêm ganhando espaço. São, segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mais de 1,6 milhão de pessoas. A diversidade de povos e línguas é imensa: de acordo com dados do Instituto Socioambiental (ISA), resistem, no Brasil, cerca de 266 povos falando mais de 160 línguas. Muitos deles vão estar reunidos em Brasília, de 22 a 26 deste mês, no Acampamento Terra Livre, que completa 20 anos em 2024. Entre os desafios a enfrentar, está o marco temporal, que representa o perigo de destruição dos povos indígenas e dos biomas que eles protegem. 


 

Antigas e novas lideranças

O cacique Raoni, uma das lideranças mais respeitadas por todos os povos e que subiu a rampa do Palácio do Planalto na posse do presidente Lula em 2022, aos 92 anos, inspira gerações de indígenas. É também neste mês que Ailton Krenak, que pintou o rosto em uma sessão da Assembleia Constituinte para protestar contra o retrocesso dos direitos dos povos indígenas em 1987, assume a cadeira número 5 da Academia Brasileira de Letras.

Aos 70 anos, o primeiro indígena imortal – segundo nossos parâmetros – tem contribuído para pensar o planeta e nosso futuro por meio de livros como “Ideias para adiar o fim do mundo” (2019), “Futuro ancestral” (2022), “Amanhã não está à venda”, “A vida não é útil”, ambos de 2020. Ano passado, o também escritor Daniel Munduruku trouxe mais elementos das culturas indígenas para o público ao atuar como o pajé Jurecê na telenovela “Terra e Paixão”, das organizações Globo.

Mulheres e meninas indígenas também vêm demonstrando sua força e sua potência. Sonia Guajajara, aos 50 anos, ocupa o cargo de ministra dos povos indígenas. A primeira escritora indígena do Brasil, Eliane Potiguara, agora com 73 anos, abriu caminho para gerações como a de Sonia e para as ainda mais jovens, que usam a tecnologia para se expressar e produzir conteúdo sobre as culturas indígenas e se posicionar politicamente diante dos acontecimentos. A própria Sam Saterê-Mawé, bióloga, que está grávida e espera a chegada do bebê Wynoã, Vanessa Neres, comunicadora e pertencente ao povo Kaingang, a ativista ambiental Beka Munduruku, conhecida como a Greta Thunberg da Amazônia, Txai Suruí, única indígena e brasileira a discursar na COP-26, além de coordenadora da Associação de Defesa Etnoambiental Kanindé e do Movimento da Juventude Indígena de Rondônia, Joenia Wapichana... São muitas essas mulheres e meninas bioma que nos trazem, ao mesmo tempo, esperança e consciência da necessidade de agir pelo planeta e por todos/as.


Em janeiro, o documentário “O Território”, sobre a luta dos indígenas Uru-Eu-Wau-Wau, recebeu o prêmio Emmy, na categoria mérito excepcional na produção de documentários, fazendo chegar ainda mais longe a luta dos povos indígenas. Em tempos de aquecimento global e emergência climática, a voz dos povos originários ecoa em nós. E eles nos pedem ajuda. O que vamos fazer?


 

Para refletir (sozinho/a e com as suas turmas): O que conheço e que visão/ões tenho dos povos originários do Brasil? Conheço seus representantes, o que defendem e um pouco da sua cosmovisão? O que sei sobre o marco temporal? Como integrar os saberes indígenas às práticas em sala de aula?

 

Texto: Fernanda Veneu

Imagens: Pixabay

 

Alguns perfis no Instagram

Articulação de Povos Indígenas do Brasil (notícias e posicionamentos dos povos indígenas sobre questões como marco temporal, acampamento terra livre, entre outros) - @apiboficial

Instituto Socioambiental (informações sobre os povos indígenas, suas línguas, pautas, debates, entre outras questões) - @socioambiental

Ancestralidade Indígena (conteúdos e atualidades sobre os povos indígenas) - @ancestralidade.indigena

 

Ativistas indígenas

Beka Munduruku - @bekamunduruku

Eliane Potiguara - @elianepotiguara

Joenia Wapichana - @joeniawapichana

Sam Saterê-Mawé -  @sam_sateremawe

Tukumã Pataxó - @tukuma_pataxo

Txai Suruí - @txaisurui

Vanessa Neres - @vanessa_fe_ha

 

Documentários

A luta do povo Karipuna para não desaparecer na Amazônia (2023)

12 episódios. DW Brasil. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=UBwkmQhoIIQ

Brasil Tupinambá (2022)

Direção: Celene Fonseca. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=IbQctosjaC4

Falas da Terra (2021)

Direção: Antônia Prado. Disponível em https://www.youtube.com/watch?v=repPmoz8ozQ

O Território (2022)

Direção: Alex Pritz. Disponível em Disney +

 


 

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